#46 Sempre alerta
sobre estar sempre esperando por uma tragédia que quase nunca vem (ainda bem)
“Você está sempre esperando uma tragédia acontecer”, disse minha psicóloga um dia desses. Quem faz terapia vai entender quando eu digo que certas coisas não fazem sentido na primeira vez que você escuta, mas depois que você mergulha em si, você acha um oceano de verdades que você ainda não explorou por puro medo do que ia descobrir.
Minha vida não é perfeita, longe disso, mas também não posso reclamar dos meus dias vividos até aqui. Tiveram tempos difíceis? Óbvio que tiveram. Mas nunca nada que me fizesse sentir com menos sorte ou privilégio. Dito isso, por algum motivo, eu fico sempre à espera da tragédia, do susto, do imprevisível. Não é possível que tudo vai ser tranquilo sempre, sem grandes consequências, a não ser as que a vida impõe e não abre mão de colocá-las no nosso caminho.
“Se você me atacar, eu vou atacar” é a frase de alguns, mas a minha é “se você me atacar, eu já estou vestindo uma armadura, um escudo, ou seja lá o que estiver ao meu alcance”. Minha cabeça transita por tantos cenários que eu não quero que aconteçam, que se um dia eles acontecerem, é como se eu já estivesse preparada pra isso. “Bem feito, universo, você não vai me pegar de surpresa. Eu já sabia que a tragédia poderia acontecer. Estou vários passos à sua frente”.
Não é bom estar vestindo uma armadura vinte horas por dia (existe quem faça eu me permitir ser vulnerável por algumas horinhas). A armadura bloqueia o mau, mas muitas vezes também bloqueia o que é bom. Ela me impede de acreditar que, às vezes, tudo simplesmente pode estar bem. Ela pesa. Pesa e me causa um tanto de ansiedade quando acontece alguma coisa, grave ou ridiculamente minúscula, comigo ou com alguém que eu amo, ou quando algo não acontece bem do jeito que eu esperava, ou quando eu cometo algum erro…
Ah, os erros… Tão difíceis de serem aceitos. Não os dos outros. Os meus mesmo.
Talvez seja uma característica comum da grande maioria dos seres humanos, mas errar é quase mortal para mim. A maturidade me ensinou que para viver é preciso errar, para conquistar é preciso errar, para aprender a amar é preciso errar, para ser livre é preciso errar, e eu obviamente já entendi tudo isso. Mas eu não consigo desapegar do peso da minha armadura. Eu não consigo aceitar que embaixo dela já existe uma casca grossa. Tenho medo dessa casca ser, na verdade, frágil como a de um caracol… basta alguém pisar em cima.
Pra mim é uma terapia escrever textos mais vulneráveis. É um dos momentos que eu posso imaginar a tal da minha armadura metafórica pendurada no armário, descansada, sem precisar ser usada. Minha idade traz um looping de ideias, sentimentos e convicções que quase não se conectam com as que eu tinha há 3 anos atrás. Hoje, acho a armadura meio brega. Até a metáfora é meio brega. Então, minha esperança é que ao expor ela para quem quiser ler, quem sabe ela não finalmente se aposenta e vai embora na próxima leva de roupas que eu doar?
Não quero mais armaduras na minha vida. Quero roupas leves. Eu moro no Rio de Janeiro, cacete. E aqui faz um calor absurdo.
Do outro lado do muro ❤️
1…2…3… respirei com o texto da
O individualismo da idade adulta; eu amo os textos da
- soube resumir em um texto o meu sentimento sobre o profissional
Isa te entendo como ninguém, além de imaginar todas as tragédias possíveis, eu sofro como se elas tivessem realmente acontecendo. Lembro de quando lançaram o filme 2012 e eu, uma criança na época, sofri todos os dias até chegar o grande dia 12/12/2012, eu tinha certeza absoluta que o mundo acabaria, repassava a cena de todos que eu amo morrendo na minha imaginação várias e várias vezes. Agora sem dúvidas minha vida adulta se resume em tentar lidar com isso e descobrir como parar (não descobri e nem parei, mas se um dia isso acontecer volto aqui pra contar).
Ameiiii me ver aqui! Nossa, como é difícil pra gente aceitar que simplesmente gosta de muitas coisas, ne?